sábado, 26 de maio de 2012

[OS PENSADORES] Não se Obstinar Contra as Circunstâncias

Este artigo é uma continuação dos escrios de Sêneca: Superioridade e Desprendimento do Sábio, retirado da Coleção Os Pensadores. Não se Obstinar Contra as Circunstâncias tem a ver com desapego e generosidade – ou seja, no mundo da concorrência a desigualdade é visível, e no desespero para conseguir clientes, as pessoas acabam sendo injustas e se esquecem de trabalhar a cooperação ou sinergia (porque também ninguém ensina isso). Por isso, para uma vida tranquila saber abrir caminho para os outros passarem pode evitar que sejamos atropelados ou que caiamos vítimas de armações.

Fotografia: Xava Du (Flickr, CreativeCommons)

“Devemos igualmente mostrar docilidade e não  ser escravos demais das resoluções que tomamos; ceder de boa vontade à pressão das circunstâncias e não temer mudar, seja de resolução, seja de atitude, contanto que não caiamos na versatilidade, que é de todos os caprichos o mais prejudicial à nossa tranquilidade. [Que vai contra os preceitos atuais, que devemos ser fortes como os heróis de hollywood – porém, também, não é benéfico ser bonzinho ou não trabalhar o crescimento pessoal]. Porque se a obstinação é inevitavelmente inquieta e deplorável, visto que a fortuna lhe arranca a todo momento qualquer coisa, a leviandade é ainda muito mais penosa, porque ela não se fixa em nada. Estes dois excessos são funestos à tranquilidade da alma: recuar-se a toda alteração e nada suportar.

Mas não adianta nada ter eliminado as causas da tristeza pessoal, pois algumas vezes acontece um desgosto pelo gênero humano se apossa de nós, quando percebemos quão grande é a quantidade de crimes felizes; quando refletimos até que ponto é rara a retidão e desconhecidas a inocência e a sinceridade, desde que ela não convenha; quando notamos os lucros e as dissipações das paixão desregrada, igualmente odiados, e a ambição que vai além de seus próprios limites, a ponto de procurar seu esplendor através da baixeza. Então mergulha o espirito em noite escura; e destas virtudes assim transformadas, que em ninguém se espera ver, nem são de utilidade alguma para quem as tem, originam se densas trevas.

Acrescentamos que se presta melhor serviço ao gênero humano ao se rir dele do que ao lamentá-lo: o gracejador nos deixa alguma esperança de melhorar, o outro se aflige estupidamente com os males que desesperadamente procura remediar. Enfim, para quem julga as coisas de um ponto de vista mais superior, uma alma mostra-se mais forte abandonando-se ao riso do que cedendo às lagrimas. [Pois] o hábito de se sujeitar à opinião de outrem é um mal tão inveterado que o mais espontâneo de todos os sentimentos, a dor, tem também sua afetação.”

Praticar a simplicidade

Um outro gênero de inquietude, que não merece menos atenção, nasce do cuidado que o homem emprega em fingir e em jamais se deixar ver tal como é: é o caso de muitas pessoas, cuja vida é só hipocrisia e comédia. Que tormento, esta permanente vigilância sobre si mesmo, este terror de ser surpreendido num papel diferente daquele que se escolheu! E esta preocupação não nos deixa mais, desde o instante em nos perssuadimos de que somos julgados a cada olhar que nos lançam. Com efeito, aparecem mil desfalecimentos, que satisfação! Mas que segurança pode oferecer uma existência inteira passada sob uma máscara?

Que encanto, ao contrário, na espontânea simplicidade de um caráter, que desconhece os ornamentos artificiais e que despreza desfarçar-se! É verdade que corremos o risco de perder a consideração, abrindo-nos ingenuamente demais a todos: pois não faltam pessoas para menosprezar o que se lhes toma acessível. Mas a virtude não pode ser de modo algum desprezada, quando oferecida a todos os olhares; e não é melhor ser menosprezado por sua fraqueza do que impor-se o suplício de uma dissimulação perpétua? Todavia, não excedamos à medida: pois há muita diferença entre a sinceridade e a falta de modéstia.”

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