quarta-feira, 13 de julho de 2016

Cadernos de Finanças Públicas: Federalismo Fiscal {Trechos I}


Fonte: Escola de Administração Fazendária. Cadernos de Finanças Públicas - 13 (dez. 2013) - Brasília: ESAF, 2000-Anual (p. 69-76).
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3. Análise crítica do federalismo fiscal brasileiro: problemas e perspectivas

Phelippe Toledo Pires de Oliveira
Andrei Aguiar
Raquel Fátima Chini da Rocha

Federalismo Fiscal nada mais é do que a forma como se relacionam as competências materiais (despesas) e as formas de seu financiamento (receitas) nos diferentes níveis de governo (estados, províncias, cantões, municipalidades etc.).

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O federalismo fiscal está intrinsecamente relacionado com a descentralização, isto é, saber quais recursos e competências devem ser alocados aos entes regionais e locais. Essa descentralização pode ser: (a) administrativa – recolhimento de tributos pelo governo central e transferência de recursos para os entes descentralizados, que deverão gastá-los em consonância com as diretrizes estabelecidas pelo governo central; ou (b) fiscal – em que os entes descentralizados possuem os próprios tributos e desempenham suas atividades de acordo com critérios por eles mesmos definidos, ainda que sujeitos a limitações do governo central.

Diversas são as vantagens da descentralização de atividades (e recursos) para os entes de governo locais e regionais (estados, províncias, cantões, municipalidades etc.). O principal argumento é que ela favorece a proximidade do governo com seus cidadãos, permitindo, com isso, melhor identificação das preferências dos diferentes grupos sociais. Porém, existem também supostas desvantagens: maior risco de corrupção e maior sujeição a pressões políticas decorrentes dessa proximidade; parasitismo do entes, provenientes do mecanismo de transferências e repasses de recursos pelo governo central; e necessidade de uma estrutura de controle gerencial da despesa pública pelo órgão central.

Federalismo Fiscal no Brasil


O particular federalismo brasileiro ocorre pela União de estados, municípios e o Distrito Federal. [...] Nota-se no âmago do pacto federativo, que a isonomia e a autonomia partem de dois lados de uma mesma moeda: competências materiais distribuídas e, para fazer frente a elas, competências financeiras. Esse é o objeto do federalismo fiscal. Muitas discussões enfocam a briga por recursos, sem uma preocupação séria e necessária com a repartição de competências materiais. A isonomia será alijada se esses dois aspectos não estiverem casados.

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Os arts. 157 a 162 da Constituição trazem as principais regras de transferência de receitas da União para os estados, Distrito Federal e municípios e dos estados para seus municípios. Os repasses ocorrem diretamente ou por meio de fundos de participação. O Fundo de Participação dos Estados (FPE) e o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) representam o maior volume de repasses, oriundos da arrecadação do imposto de renda e do imposto sobre produtos industrializados.

[...]

Rezende [Fernando Rezende. Federalismo fiscal no Brasil. Revista de Economia Política, v. 15, n. 3, p. 5-17, jul./set., 1995, p.13.14.], antes do primeiro decênio da Constituição de 1988, já alertava para alguns aspectos deletérios desse modelo de transferência de receitas para o federalismo fiscal. De um lado, a concentração de competências em um ente central favorece a arrecadação e a fiscalização tributária, mas, em contrapartida, retira o imediatismo entre o poder tributante e o contribuinte. Os entes que recebem a receita têm o bônus de gastar sem o ônus de instituir o tributo. Assim, evitam o desgaste político e o controle social local. Em outras palavras, os repasses diminuem a autonomia dos entes políticos, própria do federalismo, como também prejudicam a accountability.

O clientelismo e a acomodação também são decorrentes desse modelo. Os fundos das regiões menos favorecidas (FNE, FNO e FCO) raramente entram em debate sério nas bancadas políticas e jurídicas. Talvez fosse salutar estabelecer metas (ver Como Saber se o Governo é Correto? em Penso, logo escrevo), pois não é razoável acreditar que as regiões serão eternamente desiguais. O modelo de repartição de receitas destina proporcionalmente a maior parte dos recursos para os estados e municípios das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, sem lhes cobrar resultados e distorcendo o que seja equilíbrio. [...] A irregular distribuição da representação dos Estados e Congressos, que fez às vezes de Poder Constituinte, estava é está no cerne dos problemas de nosso federalismo.

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A falta de debate político sobre a forma de repartição de receitas e autonomia financeira dos entes federados resulta em gasto irresponsável do dinheiro público. Carlos Eduardo Gasparini e Cristiano Santos Lúcio de Melo defendem um modelo de repartição de receitas ótimo, em especial para os municípios, calcado em análise de coeficientes que demonstrem três parâmetros: a eficiência pública municipal na provisão de serviços, o esforço arrecadatório próprio e a necessidade de serviços para equilibrar a situação das municipalidades desses estados. Embora o estudo se volte para os municípios, similares conclusões podem ser alcançadas para os estados. Assim, repensar o atual modelo deve pautar toda a discussão acerca de reforma tributária. 

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